Publicamos o texto abaixo originalmente no Facebook. Pelo receio de perdê-lo e considerando a importância da discussão o publicaremos aqui também. Em menos de dez dias o texto alcançou 7.415 pessoas, teve 111 likes e 53 compartilhamentos. É quase nada, mas é significante para nós. Entenda o caso.
“Encha a cara de tatuagem e depois reclame do preconceito quando não arranjar emprego” é o meme que circula em uma fanpage para jovens da direita e que tem sido compartilhado – pasme – por pessoas da comunidade da modificação corporal em tom de chacota. A foto do meme é do querido Victor Peralta, que obviamente não autorizou o seu uso e que obviamente não deve reclamar pela falta de emprego, uma vez que é um profissional da tatuagem e performer mundialmente conhecido, ou seja, ele trabalha e não é pouco viu.
Vamos pensar um pouco…
1. Houve um tempo em que se esperava que a juventude fosse sinônimo daquilo que é novo, mas veja, há uma juventude – como a que movimenta essa fanpage de direita – que é o retrato mais que óbvio de tudo que é o atraso, conservadorismo e reacionarismo. A juventude que berra aos quatro cantos bolsomito e não sente vergonha.
(Quadrinhos dos anos 10 por André Dahmer)
2. Juventude que reafirma estigma e preconceito contra tatuagem é juventude reacionária sim. Faltou na aula de história e filosofia sim. Faltou na aula de Biologia também, pois caso contrário teria aprendido a importância da diversidade para a própria vida.
(Campanha Daqui 5 anos da Johnie Walker, pedia aos clientes para rever seus conceitos)
3. Estamos no século XXI (aceitem!), já foi o tempo em que emprego era o mesmo que estar nos moldes da tecnocracia higienista. Existem muitas formas de emprego não formais, inclusive se tornar um profissional da tatuagem é um tipo de emprego e que diga-se de passagem é bastante rentável. Diga-se de passagem que tem profissional da tatuagem com salários bem altos, viajando o mundo inteiro, construindo um monte de histórias bonitas. E é verdade que tem profissionais da tatuagem que não ganham enormes salários, mas estão ali na labuta, como eu, como você e como a maioria da população.
4. Há um monte de profissões e empresas que cada vez mais quebram as normas sobre o corpo do funcionário e funcionária. Estamos bem longe do que seria o ideal, mas já estamos nesse processo. Percebe o quão atrasado estão esses jovens? Percebe o quão parados no tempo essas pessoas estão?
(Projeto Judging America de Joel Pares problematiza os estereótipos e estigmas)
5. Na República Tcheca houve um candidato para presidência do país com mais de 90% do corpo tatuado, INCLUSIVE O ROSTO. Esse mesmo sujeito é um dos professores mais respeitados das universidades tchecas. Percebe o quanto estamos atrasados ao dizer que as pessoas que tatuam o rosto não são capazes de conseguir emprego?
(Professor doutor Vladimír Franz, candidato à presidência da República Tcheca em 2012)
6. Vamos reclamar sim, vamos reclamar e muito para que TODAS as pessoas tenham acesso ao trabalho, reconhecendo que esse seja um direito humano básico. Vamos reclamar pelas pessoas trans*, pelas pessoas com deficiência, pelas pessoas com tatuagem na cara e por todas aquelas que são impedidas de trabalhar por conta de seus corpos. Vamos reclamar todo dia e estranhamos que a sua indignação bem seletiva siga em linha oposta, reafirmando que algumas pessoas são mais pessoas que outras. Isso é segregação social e isso é errado. Já ouviu falar sobre Nazismo? Apartheid? Fascismo? Não? Corra para as aulas de história.
(Campanha do PURAS e Ministério Público do Trabalho contra o preconceito no trabalho)
7. ACEITEM: vai ter gente com rosto tatuado trabalhando sim e esse número vai aumentar tanto e tanto que um dia vocês vão sentir vergonha de dizerem essas sandices.
(É justamente reclamando que as pessoas vão ganhando direitos básicos e fundamentais)
8. Por fim, não gosta de tatuagem na cara? Não tatue a cara.
(Você realmente não tem que me dizer que não gosta das minhas tatuagens. Sua opinião nunca cruzou minha mente quando eu escolhi me tatuar.)
1 thoughts on “Tatuagem, trabalho e preconceito…”