“Desequilíbrio” por Marcos Abranches

Des   prefixo de negação (ou de ausência)
Equi   igual
Libração ato de librar-se ( movimento oscilante de um corpo até que fique equilibrado )

Talvez seja realmente esta a minha missão. Quando Deus colocou a dança em minha vida, não me perguntou se eu a queria ou não. Simplesmente a colocou.
Deus não pergunta.
Mas de uma coisa estou certo. Ele me fez dançarino, para que, entre tantos outros, obsecre ao mundo que reflita sobre a ausência do igual.
Meu corpo não oscila para o movimento físico. Oscilo meu corpo na busca permanente da libração. Para aqueles que não sabem o verdadeiro significado do igual e pensam que igual é corpo e mente semelhante, não entendem que a equidade é a disposição para  reconhecer imparcialmente o direito de cada um, e que a equidade revela nas pessoas o amor, o senso de justiça, a imparcialidade, a isenção e a ética. A minha dança oscila o meu corpo clamando por lisura e reflexão sobre o modo de agir, pensar e opinar das pessoas. Honestidade e integridade não são somente padrões que os outros enxergam em nós. Oscilo meu corpo para que as pessoas possam interiorizar os seus verdadeiros valores de equivalência.
Se estiverem vazios, por Deus, que a Arte os alimente.
Algumas pessoas podem pensar: Se somos o sopro de Deus, quem nasce com deformações físicas ou mentais são frutos de um sopro defeituoso ?


A resposta para este tipo de desigualdade é que não há sofrimento ao redor de nossos passos. O mal supostamente forjado não está naqueles que o carregam, mas naqueles que padecem da aflição de sua própria ansiedade, respeitável, mas inútil, projetando e mentalizando ocorrências menos felizes para a vida dos portadores de deficiência, que, em muitos casos, não são vistos como se supõe e, por vezes, nem chegarão a vê-los assim.
Estes não oscilam seus corpos e nem suas mentes.
Acredito que entendemos melhor os normais. A recíproca não é verdadeira. À medida que as limitações surgem, voltamo-nos para a essência da vida e compreendemos mais a missão que temos aqui na Terra. Para nós, a simples reflexão sobre a dor e o sofrimento, basta para evidenciar que têm uma razão de ser muito profunda. A dor é um alerta da natureza, que anuncia algum mal que está nos atingindo e que precisamos enfrentar.
Para muitos dor é lamúria.
Para muitos, dor é a desculpa para as fraquezas de suas almas.
Meus movimentos oscilantes não são alerta para a deficiência física, mas para a deficiência do desamor. Procuro despertar nas pessoas as mazelas provocadas pelo egoísmo e preconceitos que corroem a alma e fomentam o ódio, o orgulho, a indiferença e a aflição do próximo, asfixiando os mais nobres ideais da vida, alimentando o campo fértil da ignorância com os ingredientes venenosos da revolta e da insensatez.
Oscilo meu corpo para o equilíbrio, para o despertar do vazio e isolamento causado pela solidão. A desestética dos movimentos são as desestéticas sentida pelo abandono e pela rejeição, entendendo que o bálsamo está na proteção do amor. Busco nos meus movimentos um mundo sem angústia, sem dores, sem desespero. Busco a vida. Busco na dança o equilíbrio do corpo e o belo da alma.

“A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios: 
Por isso cante, chore, dance, ria e viva intensamente
antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos ”.
( Charles Chaplin )

Marcos Abranches ( 33 ) é portador de deficiência física, dançarino e coreógrafo. Em 2003 integrou-se à CIA FAR 15, atuou nos espetáculos Senhor dos Anjos; Jardim de Tântalo e Metamorfose de Franz Kafka, todas coreografados e dirigidos por Sandro Borelli e Sônia Soares. Incentivado por Phillipe Gemet, desenvolveu um trabalho coreográfico com mais duas bailarinas e fundou o Grupo Vidança, apresentando a peça Desequilíbrio, que posteriormente transformou-se em um espetáculo solo, com mais de, até hoje, 100 espetáculos. Participou do Kulturdifferenztans, em Colônia (Alemanha) e Crossings Dance Festival em Düsseldorf (Alemanha), apresentando Via sem Regra sob direção de Gerda König.  Atuou na peça Trem Fantasma, em uma adaptação, no Brasil, da obra Navio Fantasma de Wagner, dirigido por Christoph Schligensielf, rendendo-lhe o convite para atuar na temporada de 2008,  agora reeditada para outubro de 2010, da ópera teatralizada da Vida e Obra de Joana D’Arc, no Deutsche Open Berlin, dirigida por Christoph Schligensielf,  um dos mais respeitados diretores de toda Europa.

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