Aconteceu ontem na Sick n Silly, São Paulo, o fórum que pretendia discutir a modificação corporal na atualidade. Para isso foram convidados importantes nomes da body mods nacional, tais quais Andre Fernandes, Luciano Iritsu, T. Angel e André Meyer, que infelizmente não pode estar presente. Ainda foi possível ouvir um pouco da história do body piercer argentino Pablo Peremulter.
O fórum aconteceu em um momento em que os ânimos das pessoas envolvidas com body mods no Brasil estão bastante agitados, com frequentes discussões em redes sociais sobre os limites do body modifier e do sujeito modificado e, também questões sobre ética e sobre a competência dos profissionais estão em pauta. Até aí nada de novo, todas essas discussões e inclusive muito parecidas nas formas, já aconteceram (e acreditamos que acontecerão sempre) com quase todas as modificações corporais. Desde o piercing (que hoje chamamos de básico ou tradicional), passando pelas escarificações, os implantes e chegando agora na bola da vez, que são as tatuagens no globo ocular. Não queremos com isso reduzir a necessidade, urgência e importância da discussão, muito pelo contrário. Todavia, queremos apresentar e reforçar que historicamente essas discussões exaltadas sempre aconteceram, mudando apenas as personagens, de acordo com o tempo.
O que há de (mais ou menos) novo nisso tudo é a forma com que as discussões estão acontecendo, muitas vezes expostas em redes sociais abrindo espaços para que pessoas totalmente fora do contexto adentrem na “briga”. Pois uma discussão que poderia ser benéfica, construtiva e acima de tudo que precisa ser e acontecer, vira um simples e leviano “barraco”. Todos que vivem da ou a modificação corporal e querem ser levados a sério, perdem com situações assim. Tantos outros perdem a oportunidade de ficarem calados sobre assuntos que não compreendem.
Bem, falamos em “mais ou menos novo”, no sentido de proporção, pois o uso de redes sociais para essas discussões parecem solo cativo. No Fotolog já vimos situações parecidas, no Orkut igualmente, principalmente nas comunidades específicas sobre o tema, o lema “vou xingar muito no Twitter” parece que cabe bem aqui. No IAM do website BMEzine, haviam também fóruns para discussão e que muitas vezes também tiveram ânimos exaltados. Mas de todas as redes apresentadas, essa nos parecia mais adequada, uma vez que era uma rede social especificamente para modificados e modificadores. Não queremos com isso sugerir nichos ou segregações, apenas demonstrar a nossa sensação, de que quando a discussão estava enquadrada naquele espaço eletrônico, o risco de ter opiniões vazias, superficiais e descontextualizadas era menor.
Um aviso e repetindo o que já dissemos em outras publicações, discussões e problemas que rondam o âmbito pessoal (sejam dos profissionais ou dos entusiastas), não estarão nesse texto.
Acreditamos profundamente na força e capacidade de transformação através de fóruns fora do ambiente virtual, assim como o que aconteceu ontem, mas infelizmente a procura é sempre absurdamente baixa. Claro que é mais fácil discutir as coisas pelas redes sociais e obter informações à distância, mas utilizado de maneira isolada será que este seria o melhor caminho¿ Fica a questão.
[Parte do texto deletada a pedido de um dos participantes do fórum- 19/01/2015]
Sequencialmente tivemos a fala de Andre Fernandes, pioneiro brasileiro nas body mods denominadas extremas. Houve um apontamento e alerta importante do profissional sobre o uso do BMEzine.com na formação dos profissionais. O website nas palavras de Andre “é uma faca de dois gumes”, justamente por hospedar procedimentos realizados por profissionais extremamente competentes, assim como outros tantos processos de pessoas que só se aventuram pelas práticas, não podendo até mesmo ser consideradas profissionais. Outro problema é quando somente o BME é usado para a formação de um profissional. Concordamos que realmente é preciso muito mais para a formação de um sujeito.
Debate igualmente interessante surgiu, quando foi analisado o perfil de alguns novos profissionais da body mods. Segundo Andre, antes havia um processo em etapas. Um sujeito que pretendia trabalhar com body mods inicialmente entrava como ajudante em algum estúdio, posteriormente trabalhava com o piercing e sequencialmente com body mods, indo das mais leves (scalp, scar por exemplo) e podendo chegar nas mais extremas (splits, implantes, etc). Hoje existe um salto e a fase de aprendizado entre ser um ajudante e um piercer é anulada, com muitas pessoas indo direto para as body mods mais extremas, sem ao menos saber como realizar corretamente um procedimento de perfuração básica.
Andre faz questão de lembrar e pontuar que os procedimentos de body mods, tratando aqui os mais invasivos, são ilegais em qualquer parte do mundo.
Alguns problemas foram levantados e debatidos, como a baixa procura e participação dos profissionais das modificações do corpo em eventos educativos. Sabendo que temos uma quantidade alta de profissionais, por qual motivo se daria a ínfima porcentagem de participações¿ Questão realmente pertinente.
Foi também debatida a questão da tatuagem no globo ocular no Brasil. Grosso modo, as preocupações que foram levantadas são as mesmas que já escrevemos e que o Shannon Larrat também o fez no BME. É um procedimento novo, não é conhecido todos os riscos e isso é problemático e acaba por sua vez oferecendo mais riscos do que um procedimento que já tenha sido executado inúmeras vezes. Repetindo, no fórum foi muito debatida a qualidade da formação dos body modifiers e com o eyeball tattooing não foi diferente. Assim sendo, as rejeições e preocupações ficaram nesse âmbito.
Luciano Iritsu apresentou em sua fala um panorama de sua trajetória na body mods. Os debates em torno de sua fala, acabaram sendo pontuais na questão da suspensão corporal. Muito se falou sobre ser um procedimento agressivo e que não deveria acontecer descontextualizados em ambientes públicos. Falou-se também na questão do sangue e como isso poderia – de repente – chocar negativamente. Em suma, as opiniões acabaram ganhando características pessoais, com aprovações e reprovações sobre a discussão. O consenso ficou, que independente de como, quando e onde a suspensão seja realizada, a preocupação deve girar em torno da segurança em torno das perfurações e colocações de ganchos, procurando propiciar ao sujeito que será suspenso (assim como para o profissional) um processo seguro e sadio.
Thiago Soares, o único que não era um profissional da modificação do corpo, apresentou em sua fala um pouco de sua história com as mods. Relatou dados de sua pesquisa acadêmica “A Modificação Corporal no Brasil – 1980-1990” e por fim falou brevemente do trabalho com o FRRRKguys.com.br.
Quando questionado sobre os debates que aconteceram no fórum, foi pontual:
– Acredita que uma onda de conservadorismo esteja surgindo na comunidade da modificação corporal na atualidade. Reflexo de uma sociedade que está passando por esse mesmo processo, basta olhar para a politica nacional vigente.
– Acredita que a suspensão corporal pode ser agressiva para algumas pessoas sim, mas que é relativo. Para exemplificar traçou comparações com o MMA, um esporte extremamente violento, que mostra tanto sangue quanto uma suspensão, mas que dentro de uma cultura ocidental, branca, heterossexual é aceito.
Fechando o ciclo de falas, Pablo nos apresentou um pouco do panorama argentino e colaborou com novas discussões e debates acerca da capacidade do Brasil em produzir profissionais altamente capacitados.
Concluindo, apresentamos aqui apenas uma síntese de tudo o que aconteceu, deixando claro que não nos aprofundamos em todos os debates e detalhes. A equipe da Revista Tattoo Art e Almanaque Digital de Tatuagem estiveram presentes justamente coletando essas informações e no decorrer dos próximos meses vocês poderão ler e ver algumas coisas do Fórum.
Fica a nossa sugestão de que as pessoas que trabalham ou fazem body mods, participem de eventos assim. São momentos muito especiais e oportunidades de enriquecer muito mais as discussões que giram em torno de tais práticas.
Eu aguardo ancioso o video que foi captado durante o debate. Porque palavras dão vida a imaginação do autor do texto, agora imagens evidenciam o que realmente fora abordado e da maneira que seguiu tal Fórum que no meu ver foi bem produtivo para todos os presentes…Discurso? Que tal das colocações… Abração Thiago 🙂 !
Foi muito produtivo mesmo meu amigo Snoopy, é incrível como sempre há o que aprender e estudar nessa área. Acho que todos os presentes puderam ouvir e falar aquilo que achavam pertinente pra discussão toda e isso tudo rendeu coisas boas demais. Claro que os vídeos elucidarão ainda mais tudo o que aconteceu, mas bato o pé que seria lindo se tivesse mais gente participando lá com a gente. A coisa teria sido mais rica ainda.
Novamente, muito obrigado por dividir o seu conhecimento e por ter esclarerido as minhas dúvidas todas.
Torço para que eventos assim aconteçam mais. Gratidão!